quarta-feira, 5 de setembro de 2007

A verdade sobre o Governo Mundial da ONU

BAHÁ’U’LLÁH


Nesse artigo está descrito todo o verdadeiro plano do governo Mundial da ONU. Conta inclusive os principais detalhes do sonho de Bahá’ulláh, onde o governo mundial receberá o seu nome.

Uma noite, em sonho, estas exaltadas palavras foram ouvidas de todos os lados: "Verdadeiramente, Nós Te faremos vitorioso por Ti mesmo e por Tua Pena. Não lamentes pelo que Te tem sobrevindo, nem temas, pois estás em segurança. Em breve, Deus fará que se ergam os tesouros da Terra - homens que hão de ajudar-Te por Ti e por Teu Nome, por meio do qual Deus ressuscitou o coração dos que O reconheceram." (10)


Com o auxílio de um deus estranho agirá contra as poderosas fortalezas; aos que o reconhecerem multiplicará a honra, e os fará reinar sobre muitos, e repartirá a terra por preço. (Daniel 11 : 39)

A profecia do dia da revelação pode ser lida no livro Seleções dos escritos de Baha-u-llah (antes de ler esses escritos tenha certeza que a sua fé está somente em Jesus, algumas pessoas nos EUA mais sensíveis espiritualmente não se sentiram bem ).

Artigo na íntegra:

À medida que o novo milênio se aproxima, a necessidade crucial da raça humana consiste em encontrar uma visão unificadora da natureza do Homem e da sociedade. Durante os últimos cem anos, a resposta da humanidade a este impulso conduziu a uma sucessão de convulsões ideológicas que perturbaram fortemente o nosso mundo, e que parecem estar agora a extinguir-se. A paixão investida na luta, apesar dos seus resultados desencorajadores, atesta a profundeza desta necessidade. Pois, sem uma convicção comum sobre o curso e a direção da história humana, é inconcebível que se possam estabelecer as fundações de uma sociedade global na qual a generalidade da humanidade se possa empenhar. Uma tal visão surge nas escrituras de Bahá’u’lláh, a figura profética do século XIX cuja crescente influência constitui o desenvolvimento mais notável na história religiosa contemporânea. Nascido na Pérsia, em 12 de novembro de 1817, Bahá’u’lláh (1) começou, com a idade de 27 anos, um empreendimento que gradualmente tem captado a imaginação e a lealdade de vários milhões de pessoas de praticamente todas as etnias, classes e nações da terra. Este fenômeno não tem quaisquer pontos de referência no mundo contemporâneo, mas está antes associado a mudanças de direção climáticas no passado coletivo da raça humana. Pois Bahá’u’lláh afirmou ser nada menos que o Mensageiro de Deus para a era da maturidade humana, o Portador de uma Revelação Divina que cumpre as promessas feitas por religiões anteriores, e que gerará as energias e os sustentáculos espirituais para a unificação dos povos do mundo. Se nada mais conseguissem fazer, os efeitos que a vida e escrituras de Bahá’u’lláh já tiveram, deveriam chamar a mais viva atenção de todos os que acreditam que a natureza humana é essencialmente espiritual, e que a futura organização do nosso planeta deve ter em conta este aspecto da realidade. A documentação encontra-se disponível para escrutínio geral. Pela primeira vez na história, a humanidade tem ao seu dispor um registro detalhado e verificável do nascimento de um sistema religioso independente, e da vida do seu Fundador. Igualmente acessível é o registro da resposta que a nova Fé desencadeou, com o surgimento de uma comunidade global que, com toda a justiça, já pode afirmar que representa um microcosmo da raça humana.(2) Durante as primeiras décadas deste século, este desenvolvimento foi relativamente obscuro. As escrituras de Bahá’u’lláh proíbem o proselitismo agressivo através do qual muitas mensagens religiosas têm sido vastamente promulgadas. Além disso, a prioridade que a comunidade Bahá’í deu ao estabelecimento de grupos a nível local por todo o planeta, pesava fortemente contra um surgimento inicial de vastas concentrações de crentes num qualquer país, ou a mobilização de recursos necessários para programas de informação pública em larga escala. Arnold Toynbee, intrigado por fenômenos que poderiam representar o surgimento de uma nova religião universal, observou nos anos cinqüenta que a Fé Bahá’í era na época tão familiar ao ocidental instruído médio quanto o Cristianismo havia sido à classe correspondente do Império Romano durante o segundo século da Era Cristã. (3) Nos anos mais recentes, com o rápido crescimento dos números da comunidade bahá’í em muitos países, a situação mudou de forma impressionante. Não há hoje virtualmente nenhuma área no mundo onde o modelo de vida ensinado por Bahá’u’lláh não esteja lançado social da comunidade começam a conquistar em círculos governamentais, acadêmicos e das Nações Unidas reforça ainda mais o argumento em favor de um exame imparcial e sério do impulso gerador de um processo de transformação social que é, em aspectos capitais, algo ímpar em nosso mundo. Nenhuma incerteza paira quanto à natureza do impulso gerador. Os escritos de Bahá’u’lláh abrangem um largo espectro de assuntos, que vão desde temas sociais, como a integração racial, a igualdade dos sexos e o desarmamento, até as questões que afetam a vida mais íntima da alma humana. Os textos originais, muitos em Sua própria caligrafia, outros ditados e certificados pelo Autor, foram meticulosamente preservados. Por várias décadas, um programa sistemático de tradução e publicação tem tornado seleções dos escritos de Bahá’u’lláh acessíveis a todas as pessoas, no mundo inteiro, em mais de oitocentos idiomas.
Nascimento de uma Nova Revelação
A missão de Bahá’u’lláh teve início em uma masmorra em Teerã, em agosto de 1852. Nascido em família nobre, com ancestrais que remontavam às grandes dinastias passado imperial da Pérsia, Bahá’u’lláh declinou a carreira ministerial que Lhe foi oferecida no governo, preferindo, em vez disso, dedicar as energias a uma série de atividades filantrópicas, pelas quais conquistara, por volta de 1840, amplo renome como o "Pai dos Pobres." Essa existência privilegiada decaiu rapidamente após 1844, quando Bahá’u’lláh tornou-se um dos principais defensores de um movimento destinado a mudar o curso da história de Seu país. Os primeiros decênios do século XIX foram um período de expectativas messiânicas em muitos países. Profundamente perturbados pelas implicações da pesquisa científica e da industrialização, crentes sinceros de diversas tendências religiosas buscaram nas escrituras de sua fé uma compreensão dos processos de transformação que se aceleravam. Na Europa e na América, grupos como os templários e os milleritas acreditavam ter encontrado nas escrituras cristãs provas que sustentavam sua convicção de que a história chegara ao fim e o retorno de Jesus Cristo era iminente. Excitação notavelmente semelhante desenvolveu-se no Oriente Médio, com base na crença de que várias profecias do Alcorão e das tradições islâmicas estavam a ponto de se cumprir. O mais espetacular desses movimentos messiânicos, indiscutivelmente, fora o da Pérsia, focado na pessoa e nos ensinamentos de um jovem comerciante da cidade de Shiraz, conhecido historicamente pelo cognome de o Báb. (4) Durante nove anos, de 1844 a 1853, persas de todas as classes viram-se arrastados por um vendaval de esperanças e excitação provocado pelo anúncio do Báb de que o Dia de Deus estava próximo e Ele próprio era o Prometido das escrituras islâmicas. A humanidade, dizia Ele, encontra-se no limiar de uma era que iria testemunhar a reestruturação de todos os aspectos da vida. Novos campos do conhecimento, então inconcebíveis, haveriam de capacitar até mesmo as crianças da nova era a superar os mais ilustrados dos eruditos do século XIX. O gênero humano era convocado por Deus a acolher tais mudanças empreendendo uma transformação de sua vida moral e espiritual. Sua própria missão era preparar a humanidade para o evento que representava o eixo dessa cadeia de acontecimentos: o advento do Mensageiro universal de Deus - "Aquele que Deus tornará manifesto" - aguardado pelos seguidores de todas as religiões. (5) Tais asserções despertaram violenta hostilidade no clero muçulmano, que pregava haver o processo da Revelação Divina findado com Maomé, e que qualquer afirmação contrária representava apostasia, punível com a morte. Sua denúncia contra o Báb cedo obtivera o apoio das autoridades persas. Milhares de seguidores da nova fé foram martirizados em uma série horrenda de massacres por todo o país, e o próprio Báb fora executado em praça pública, em 9 de julho de 1850. (6) Numa época de crescente envolvimento ocidental com o Oriente, esses eventos despertaram interesse e compaixão em influentes círculos europeus. A nobreza da vida e dos ensinamentos do Báb, o heroísmo de Seus seguidores e a esperança de reformas estruturais que o movimento acendera em uma terra obscura haviam exercido poderosa atração sobre personalidades que iam de Ernest Renan e Leon Tolstoy a Sarah Bernhardt e o Conde de Gobineau. (7) Em virtude de Sua proeminência na defesa da Causa do Báb, Bahá’u’lláh foi preso e, acorrentado e descalço, levado a Teerã. Protegido até certo ponto por uma reputação pessoal elevadíssima e pela posição social de Sua família, bem como pelos protestos das embaixadas ocidentais contra o morticínio dos adeptos da nova fé, Bahá’u’lláh não foi condenado à morte, como exigiam personagens influentes da corte. Em lugar disso, foi encarcerado na famigerado Síyáh-Chál, a "A Cova Negra", um calabouço profundo e infestado de insetos que fora criado em um dos reservatórios abandonados da cidade. Sem nenhuma acusação formal e sem direito a apelação, Ele e trinta de Seus companheiros foram encerrados na escuridão e imundície dessa fossa, cercados de criminosos contumazes, muitos já sentenciados à morte. Ao pescoço de Bahá’u’lláh foi presa uma pesada corrente, tão conhecida no meio penal que tinha o nome próprio. Não perecendo Ele rapidamente, como se esperava, tentaram envenená-Lo. As marcas dos grilhões iriam permanecer-Lhe no corpo pelo resto da vida. Um ponto central dos escritos de Bahá’u’lláh é a exposição dos grandes temas que têm preocupado os pensadores religiosos de todas as épocas: Deus, o papel da Revelação na história, a relação entre os sistemas religiosos mundiais, o significado da fé e a base da autoridade moral na organização da sociedade humana. Esses textos, em diversas passagens, falam intimamente de Sua própria experiência espiritual, de Sua reação ao chamado divino e do diálogo com o "Espírito de Deus" que estava no âmago de Sua missão. A história religiosa jamais ofereceu ao inquiridor a oportunidade de tão aberto encontro com o fenômeno da Revelação Divina. No final de Sua vida, os escritos de Bahá’u’lláh sobre Suas primeiras experiências espirituais continham uma breve descrição das condições do Síyáh-Chál: Fomos confinados por quatro meses em um lugar repugnante como nenhum outro... A masmorra estava imersa em espessa escuridão, e Nossos companheiros de prisão somavam aproximadamente cento e cinqüenta almas: ladrões, assassinos e salteadores. Embora superlotada, não tinha nenhuma outra saída a não ser a passagem pela qual entráramos. Nenhuma pena pode retratar aquele lugar, nem língua alguma descrever seu odor fétido. A maioria daqueles homens não tinha roupas, nem sequer uma esteira para deitar. Só Deus sabe o que Nos sobreveio nesse mais nauseabundo e lúgubre dos lugares! (8)
Todos os dias, os guardas desciam os três lances de escadas íngremes da cova, escolhiam um ou mais dos prisioneiros e arrastavam-nos para fora, para que fossem executados. Nas ruas de Teerã, observadores ocidentais horrorizavam-se com as cenas de vítimas babistas que eram explodidas de bocas de canhão, retalhadas até a morte com machados e espadas, ou forçadas a marchar para a morte com velas incandescentes inseridas em feridas abertas em seus corpos(9). Foi nessas circunstâncias, e defrontando-se com a perspectiva de Sua própria morte iminente, que Bahá’u’lláh recebeu o primeiro sinal de Sua missão:
Uma noite, em sonho, estas exaltadas palavras foram ouvidas de todos os lados: "Verdadeiramente, Nós Te faremos vitorioso por Ti mesmo e por Tua Pena. Não lamentes pelo que Te tem sobrevindo, nem temas, pois estás em segurança. Em breve, Deus fará que se ergam os tesouros da Terra - homens que hão de ajudar-Te por Ti e por Teu Nome, por meio do qual Deus ressuscitou o coração dos que O reconheceram." (10)
A experiência da Revelação Divina, transmitida apenas indiretamente nos relatos remanescentes da vida de Buda, Moisés, Jesus Cristo e Maomé, é descrita vividamente nas palavras do próprio Bahá’u’lláh:
Durante os dias em que Me encontrava na prisão de Teerã, embora o peso pungente dos grilhões e o ar fétido mal me permitissem dormir, ainda assim, nos raros momentos de sono, sentia como se algo fluísse do alto de Minha cabeça sobre Meu peito, como se fora uma poderosa torrente que se precipitasse sobre a terra do cume de uma montanha altíssima. Todos os membros de Meu corpo, com isso, ardiam em chamas. Em tais momentos, Minha língua recitava o que homem algum poderia suportar ouvir. (11)
Exílio
Por fim, ainda sem julgamento ou direito a recurso, Bahá’u’lláh foi libertado da prisão e imediatamente banido de Sua terra natal; Suas riquezas e propriedades foram arbitrariamente confiscadas. O representante diplomático russo, que O conhecia pessoalmente e acompanhara as perseguições contra os babis com angústia cada vez maior, ofereceu-Lhe proteção e refúgio em terras sob o domínio de seu governo. No clima político reinante, a aceitação de tal ajuda seria certamente deturpada como uma atitude como uma atitude com conotações políticas. (12) Talvez por essa razão, Bahá’u’lláh preferiu aceitar o desterro para o território vizinho do Iraque, então sob o domínio do Império Otomano. Essa expulsão marcou o início de quarenta anos de exílio, aprisionamento e perseguição implacável. Nos anos imediatamente após Sua partida da Pérsia, Bahá’u’lláh deu prioridade às necessidades da comunidade babí que se reunira em Bagdá, tarefa que Lhe coubera como o único autêntico líder babí que sobrevivera aos massacres. A morte do Báb e a perda quase simultânea da maioria dos mestres e guias da jovem fé haviam desorientado e dispersados o corpo dos crentes. Mas quando Seus esforços para reanimar os que haviam fugido para o Iraque despertavam inveja e dissensão, (13) Ele seguiu o caminho que todos os Mensageiros de Deus anteriores haviam trilhado - retirou-Se para a solitude, escolhendo para isso a região montanhosa do Curdistão. Sua partida, como mais tarde relataria, "não tinha retorno em vista." A razão "era para evitar tornar-se foco de discórdia entre os fiéis, fonte de pertubação para Nossos companheiros." Embora os dois anos passados no Curdistão fossem um período de intensa privação e dificuldades físicas, Bahá’u’lláh descreve-os como um tempo de imensa felicidade, durante o qual refletiu profundamente sobre a mensagem que Lhe fora confiada: "Sozinho, comungamos com Nosso espírito, esquecido do mundo e de tudo o que nele há." (14)
Somente com grande relutância, por crer ser Sua responsabilidade para com a Causa do Báb, foi que Ele afinal cedeu às insistentes mensagens dos remanescentes do grupo aflito dos exilados em Bagdá, que Lhe haviam descoberto o paradeiro e Lhe apelaram para que voltasse e assumisse a liderança de sua comunidade. Duas das mais importantes obras dos escritos de Bahá’u’lláh datam desse primeiro período de exílio, precedendo a declaração de Sua missão em 1863. A primeira delas é um pequeno livro que denominou As Palavras Ocultas. Escrita na forma de uma compilação de aforismos morais, a obra representa o cerne ético da mensagem de Bahá’u’lláh. Em versículos que Bahá’u’lláh descreve como uma destilação da guia espiritual de todas as Revelações do passado, a voz de Deus fala diretamente à alma humana:
Ó Filho do Espírito! A mais amada de todas as coisas, a Meu ver, é a justiça; não te desvies dela, se é que Me desejas, nem a descures, para que Eu em ti possa confiar. Nela te apoiando, verás com teus próprios olhos e não com os alheios; saberás pela tua própria compreensão e não pela compreensão de teu semelhante. Pondera isto em teu coração: como deverás ser. Em verdade, a justiça é Minha dádiva a ti e o sinal de Minha misericórdia. Guarda-a, pois, ante os teus olhos.
Ó Filho do Ser! Ama-Me, a fim de que Eu te possa amar. Se não Me amas, de modo algum pode o Meu amor te atingir. Sabe isto, ó servo!
Ó Filho do Homem! Não te entristeças, salvo por te encontrares longe de Nós, nem exultes, a menos que te estejas aproximando, de regresso a Nós.
Ó Filho do Ser! Com as mãos do poder, Eu te fiz; com os dedos da firmeza, Eu te criei; e dentro de ti coloquei a essência de Minha Luz. Que estejas contente com isto e nada mais busques, pois é perfeita Minha obra e inexorável Meu mandamento. Não questiones, nem alimentes dúvidas sobre isto. (15)
A segunda das duas principais obras compostas por Bahá’u’lláh durante deste período é O Livro da Certeza, uma exposição abrangente da natureza e do propósito da religião. Em passagens que discorrem não apenas sobre o Alcorão, mas com igual fluência e agudez sobre o Antigo e o Novo Testamento, os Mensageiros de Deus são retratados como agentes de um processo único e contínuo: o despertar da raça humana para as próprias potencialidades espirituais e morais. O gênero humano, tendo atingido a maioridade, é capaz de responder a uma explicitude de linguagem que transcende as limitações da linguagem das parábolas e alegorias; a Fé é uma questão não de crença cega, mas conhecimento consciente. Tampouco é necessária a guia de uma elite eclesiástica: a dádiva da razão confere a cada pessoa, nesta nova era de esclarecimento e educação, a capacidade de responder por si mesma à orientação divina. O teste é simplesmente o da sinceridade: Homem algum haverá de alcançar a orla do oceano da verdadeira compreensão, a menos que se desprenda de tudo que existe no céu e na terra. .... A essência destas palavras é: os que trilham o caminho da fé, os que têm sede do vinho da certeza, devem purificar-se de tudo o que é terreno - os ouvidos devem purificar-se de palavras fúteis, as mentes das fantasias vãs, os corações do apego às coisas mundanas, os olhos daquilo que perece. Devem por em Deus toda confiança e Nele se apoiando, prosseguirem em Seu caminho. Então se tornarão dignos das refulgentes glórias do sol da sabedoria e compreensão divinas..., desde que o homem não pode esperar jamais atingir o conhecimento do Todo Glorioso... sem que ante deixe de considerar as palavras e os atos dos homens mortais como padrões para o reconhecimento e a verdadeira compreensão de Deus e Seus Profetas. Considerai o passado. Que grande número de homens - fossem de alto grau ou humildes -, em todos os tempos, tem esperado ansiosamente o advento das Manifestações de Deus nas pessoas santificadas de Seus Eleitos... e sempre que se abriam os portais da graça, sempre que as nuvens da bondade divina concediam suas chuvas à humanidade e a luz do Invisível brilhava sobre o horizonte do poder celestial, todos O negavam e se afastavam de Seu semblante - semblante este do próprio Deus. ...Somente quando a lâmpada da busca, do esforço zeloso, do anelo, da apaixonada devoção, do amor fervoroso, do enlevo, do êxtase, for acesa no coração de quem almeja, e a brisa de Sua bondade lhe soprar na alma, serão dispersas as trevas do erro e dissipadas as neblinas das dúvidas e desconfianças, e as luzes do conhecimento e da certeza irradiarão por todo o seu ser. ...Então os múltiplos favores e as graças torrenciais emanados do santo e eterno Espírito conferirão tal vida nova àquele que busca, que ele se verá dotado de uma nova visão e de um ouvido novo, de um novo coração e de uma nova mente. ... Fitando com os olhos de Deus, perceberá dentro de cada átomo uma porta que o conduz aos níveis da certeza absoluta. Descobrirá em todas as coisas: as evidências de uma Manifestação imperecedoura. ... Quando o canal da alma humana se purificar de todos os laços obstrutores deste mundo, haverá de perceber, infalivelmente, o alento do Bem Amado através de imensuráveis distâncias e, guiada por Sua fragrância, há de alcançar a Cidade da Certeza e nela ingressar. ... Essa Cidade não é senão a Palavra de Deus revelada em cada era e Dispensação. ...Toda a guia, todas as bênçãos, a erudição, a compreensão, a fé e a certeza que foram conferidas a tudo o que existe no céu e na terra, ocultam-se dentro dessas Cidades - nelas estão entesouradas. (16) Nenhuma referência aberta se faz à missão do próprio Bahá’u’lláh, ainda não anunciada então. Na realidade, O Livro da Certeza estrutura-se em torno de uma vigorosa elucidação da missão do Báb martirizado. Uma das razões mais fortes da poderosa influência do livro sobre a comunidade babí, da qual faziam parte eruditos e ex-seminaristas, foi a mestria da doutrina e pensamentos islâmicos que o Autor demonstra ao provar a afirmação do Báb de que cumprira as profecias do Islã. Convocando os babís a serem dignos da confiança que o Báb neles depositara e do sacrifício de tantas vidas heróicas, Bahá’u’lláh apresentava-lhes o desafio de não apenas moldarem sua vida pessoal segundo os ensinamentos divinos, mas também fazerem de sua comunidade um modelo para a população heterogênea de Bagdá, a capital provincial do Iraque. Embora vivessem em condições materiais muito limitadas, os exilados foram galvanizados por essa visão. Um deles, chamado Nabil, que mais tarde legaria à posteridade a história detalhada dos ministérios do Báb e de Bahá’u’lláh, descreveu a intensidade espiritual daqueles dias:
Muitas noites, nada menos que dez pessoas se mantinham com nada mais do que um punhado de tâmaras. Ninguém sabia a quem, de fato, pertenciam os sapatos, mantos ou túnicas que se encontravam em sua casa. Qualquer um que fosse ao bazar poderia alegar seus os sapatos que calçava, e cada um que estivesse na presença de Bahá’u’lláh poderia afirmar que o manto e a túnica que usava lhe pertenciam. ... Oh! que alegria daqueles dias, que júbilo e encantamento daquelas horas! (17)
Para frustração das autoridades consulares persas, que acreditavam haver-se esgotado o "episódio" babí, a comunidade dos exilados gradualmente conquistou respeito e influência na capital provincial do Iraque e cidades vizinhas. Como vários dos principais santuários do Islã xiita localizavam-se na região, um fluxo contínuo de peregrinos persas também se expunham, em circunstâncias as mais favoráveis, à renovação da influência babí. Entre os dignitários que visitavam Bahá’u’lláh na casa simples onde residia, havia príncipes da família real. Tão encantado com essa experiência ficou um deles, que expressou a idéia algo ingênua de que, fazendo construir uma réplica da casa nos jardins da sua propriedade, poderia reviver algo da atmosfera de pureza espiritual e desprendimento que, por pouco tempo, saboreara. Outro príncipe, ainda mais profundamente tocado pela experiência de sua visita, expressou a amigos o sentimento de que "fossem todas as aflições do mundo se me amontoar no coração, dissipar-se-iam todas na presença de Bahá’u’lláh. Era como se estivesse no próprio Paraíso..." (18)
A Declaração no Jardim de Ridván
Em 1863, Bahá’u’lláh concluiu que era chegado o momento de dar a conhecer a alguns de Seus companheiros a missão que Lhe fora confiada no escuridão do Síyáh-Chál. Essa decisão coincidiu com um novo estágio da campanha de oposição à Sua atuação, sustentada incansavelmente pelo clero muçulmano xiita e por representantes do governo persa. Temendo que a aclamação que Bahá’u’lláh começava a receber dos persas influentes que visitavam o Iraque reacendesse o entusiasmo popular na Pérsia, o governo do Xá pressionou as autoridades otomanas a removerem-No para longe das fronteiras e para o interior do império. Por fim, o governo turco cedeu a essas pressões e convidou o exilado, como seu hóspede, a fixar residência na capital, Constantinopla. A despeito dos termos corteses da mensagem, seu intuito claro era o de exigir aquiescência. (19) Nesta época, a devoção do pequeno grupo de exilados viera a concentrar-se na pessoa de Bahá’u’lláh, bem como em Sua exposição dos ensinamentos do Báb. Um número crescente deles convencera-se de que Ele falava não somente como defensor do Báb, senão também em nome da causa muito maior cujo surgimento o Báb declarara iminente. Essas cogitações tornaram-se certeza no final de abril de 1863, quando Bahá’u’lláh, às vésperas da partida em Constantinopla, reuniu alguns de Seus companheiros em um jardim que mais tarde receberia o nome de Ridván ("Paraíso) e confiou-lhes o fato principal de Sua missão. Durante os quatro anos seguintes, embora nenhum anúncio público fosse considerado oportuno, esses companheiros compartilharam paulatinamente com amigos fidedignos as boas novas de que as promessas do Báb haviam sido cumpridas e o "Dia de Deus" havia alvorecido. As circunstâncias exatas dessa comunicação particular então, nas palavras da autoridade bahá’í mais intimamente familiar com os registros desse período, "envoltas em nuvens difíceis de serem dissipadas pelos futuros historiadores."(20) A natureza da declaração pode ser apreciada em várias referências que Bahá’u’lláh faria a Sua Missão em muitos de Seus escritos posteriores:
O propósito subjacente a toda a criação é a revelação deste mais sublime, mais sagrado Dia, o Dia conhecido como o Dia de Deus em Seus Livros e Escrituras - o Dia que todos os Profetas e os Eleitos e os seres santos almejaram presenciar. (21)
... este é o Dia em que a humanidade pode contemplar a Face do Prometido e ouvir-Lhe a Voz. O Chamado de Deus ergueu-se e a luz de Seu Semblante resplandeceu sobre os homens. É dever de cada um apagar da tábua do coração o traço de toda palavra vã e, com a mente aberta e imparcial, fixar os olhos nos sinais de Sua Revelação, nas provas de Sua missão e nas evidências de Sua glória.(22)
Como Bahá’u’lláh repetidamente enfatizou em Sua exposição da mensagem do Báb, o propósito primordial de Deus ao revelar Sua vontade é efetuar uma transformação no caráter da humanidade e desenvolver no íntimo dos que respondem ao Seu chamado as qualidades morais e espirituais latentes na natureza humana:
Embelezai vossas línguas com a veracidade, ó povo, e adornai vossas almas com o ornamento da honestidade. Guardai-vos, ó povo, de tratar qualquer um com perfídia, Sede os portadores da incumbência de Deus entre Suas criaturas e os emblemas de Sua generosidade entre Seu povo. Iluminai e consagrai vossos corações; não os deixeis profanar-se com os espinhos do ódio ou os cardos do rancor. Vós habitais em um só mundo e fostes criados mediante a operação de uma só Vontade. Bem-aventurado quem se associa a todos os homens em espírito de perfeita bondade e amor. (24)
O proselitismo agressivo que caracterizava os esforços para promover a causa da religião em eras passadas é declarado indigno do Dia de Deus. Cabe a cada pessoa que tenha reconhecido a Revelação o dever de compartilhá-la com os que, a seu ver, estão a buscar; a resposta, contudo, deve ficar inteiramente a cargo da consciência do ouvinte: Mostrai tolerância, benevolência e amor uns para com os outros. Se qualquer um dentre vós for incapaz de compreender certa verdade, ou estiver se esforçando por aprendê-la, mostrai um espírito de extrema gentileza e boa vontade ao conversar com ele... (25)
O dever supremo do homem, neste Dia, é atingir o quinhão da copiosa graça que Deus lhe dispensa. Que ninguém, portanto, considere o tamanho do recipiente, quer seja grande ou pequeno... (26)
Ante o cenário dos eventos sangrentos na Pérsia, Bahá’u’lláh não apenas disse a Seus seguidores que "se fordes mortos, melhor vos será do que matardes", mas instou-se a que fossem um exemplo de obediência à autoridade civil: "Em qualquer país onde algum membro deste povo resida, cumpre-lhe agir em relação ao governo desse país com lealdade, honestidade e veracidade."(27)
As circunstâncias em que se deu a partida de Bahá’u’lláh de Bagdá constituíram uma demonstração uma demonstração admirável da potência desses princípios. Em apenas alguns anos, um bando de exilados estrangeiros, cuja chegada à região gerara suspeita e aversão nos vizinhos, viera a ser um dos segmentos mais respeitados e influentes da população. Ganhavam o sustento em negócios prósperos; enquanto grupo, eram admirados pela generosidade e integridade de conduta; as acusações sinistras de fanatismo religioso e violência, persistentemente difundidas pelas autoridades consulares persas e por membros do clero muçulmano xiita, já não exerciam efeito na mente do público. Em 3 de maio de 1863, quando partiu de Bagdá, acompanhado da família e dos companheiros e criados que haviam sido escolhidos para acompanhá-Lo, Bahá’u’lláh erea uma figura imensamente popular e querida. Nos dias que precederam a partida, o próprio governador da província e um grande número de celebridades, muitas delas vindas de distâncias enormes, afluíram ao jardim onde Ele temporariamente Se alojara, a fim de render-Lhe homenagem. Testemunhas da despedida descreveram em termos comoventes a aclamação que recebeu, as lágrimas de muitos dos presentes e a preocupação das autoridades e funcionários otomanos em prestar honrarias a seu visitante. (28)
"A Imutável Fé de Deus..."
Após a declaração de Sua missão em 1863, Bahá’u’lláh começou a desenvolver um tema já apresentado no O Livro da Certeza: a relação entre a Vontade de Deus e o processo evolutivo pelo qual as capacidades morais e espirituais latentes na natureza humana encontram expressão. Essa exposição ocuparia uma posição central em Seus escritos durante os trinta anos remanescentes de Sua vida. A realidade de Deus, Ele afirma, é e permanecerá para sempre incognoscível. Quaisquer palavras que o pensamento humano aplique à natureza divina relacionam-se meramente à existência do homem e são produto de esforços humanos para descrever a experiência humana:
Longe, longe esteja de Tua glória o que o homem mortal possa de Ti afirmar ou a Ti atribuir, ou o louvor com que Te possa glorificar! Qualquer dever que Tu tenhas prescrito aos Teus servos de exaltar ao máximo Tua majestade e glória é tão-somente um sinal de Tua graça a eles, para que possam ascender à posição concedida ao seu ser mais íntimo, à posição do conhecimento de seu próprio ser. (29)
É evidente a todo coração iluminado e possuidor de discernimento que Deus, a Essência incognoscível, o Ser Divino, é imensamente elevado acima de todos os atributos humanos, tais como existência corpórea, ascensão e descida, egresso e regresso. Longe esteja de Sua glória que a língua humana celebre adequadamente Seu louvor, ou o coração humano compreenda Seu insondável mistério. Ele está, e sempre esteve, velado na eternidade antiga de Sua Essência, e permanecerá em Sua Realidade, por todo o sempre, oculto da vista dos homens..." (30)
O que a humanidade descobre ao volver-se para o Criador de toda a existência são os atributos ou qualidades que estão associados às Revelações periódicas de Deus:
Estando a porta do conhecimento do Ancião dos Dias assim fechada ante a face de todos os seres, determinou Aquele que é a Fonte da graça infinita... que aparecessem do reino do espírito aquelas luminosas Jóias da Santidade, na nobre forma do templo humano, manifestando-se a todos os homens, para que dessem ao mundo o conhecimento dos mistérios do Ser imutável e descrevessem as sutilezas de Sua Essência imperecedoura...(31)
Esses espelhos santificados...são, todos Eles, os Expoentes na Terra Daquele que é o Orbe central do universo, sua Essência e seu Propósito final. Dele recebem o conhecimento e o poder; Dele derivam a soberania. A formosura que lhes adorna o semblante é apenas um reflexo de Sua imagem, e sua revelação, um sinal de Sua glória imortal... (32)
As Revelações de Deus não diferem uma da outra em nenhum aspecto essencial, embora as necessidades mutantes a que atendem de época em época tenham requerido manifestações singulares de cada umas delas: Esses atributos de Deus não e nunca foram concedidos especialmente a certos Profetas e negados a outros. Não, todos os Profetas de Deus, Seus Mensageiros favorecidos, santos e escolhidos, são, sem exceção, os portadores de Seus nomes e incorporam Seus atributos. Diferem somente na intensidade de sua revelação, na potência comparativa de sua luz...(33)
Os que estudam a religião são exortados a não permitir que dogmas teológicos ou outras idéias preconcebidas os levem a discriminar entre aqueles que Deus utilizou como canais de Sua luz:
Acautelai-vos, ó vós que credes na Unidade de Deus, para que não sejais induzidos a fazer distinção alguma entre as Manifestações de Sua Causa, ou a discriminar contra os sinais que têm acompanhado e proclamado Sua Revelação. É este, de fato, o verdadeiro sentido da Unidade Divina - se sois dos que percebem e aceitam esta verdade. Tende certeza, além disso, de que as obras e ações de cada uma dessas Manifestações de Deus - ainda mais, qualquer coisa que lhes pertença ou que possam, no futuro, manifestar - são todas ordenadas por Deus e refletem Sua Vontade e Desígnio...(34)
Bahá’u’lláh compara as intervenções das Revelações Divinas ao retorno da primavera. Os Mensageiros de Deus não são meros educadores, embora seja essa uma de suas funções principais. Mais do que isso, o espírito de suas palavras, juntamente com seu exemplo de vida, tem a capacidade de tocar as raízes da motivação humana e induzir transformações fundamentais e duradouras. Sua influência abre novos domínios de compreensão e realizações:
E desde que não pode haver laço de intercurso direto que ligue o Deus uno e verdadeiro à Sua criação, nem pode existir semelhança alguma entre o transitório e o Eterno, o contingente e o Absoluto, Ele ordenou que em cada era e dispensação uma Alma pura e imaculada se manifestasse nos reinos da terra e do céu. ...Seguindo a luz da guia infalível e investidos de soberania suprema, (os Mensageiros de Deus) são incumbidos de usar a inspiração de Suas palavras, as emanações de Sua graça perene e a brisa santificadora de Sua revelação para purificar todo coração que anela e todo espírito receptivo, livrando-os do pó e das impurezas das ansiedades e limitações terrenas. Então, e somente então, o Tesouro de Deus, latente na realidade do homem, virá à luz... e implantará a insígnia de sua glória revelada no ápice do coração dos homens.(35)
Sem essa intervenção do mundo de Deus, a natureza humana permaneceria cativa dos instintos, como também das crenças inconscientes e padrões de conduta que não passam de heranças culturais:
Havendo criado o mundo e tudo o que nele vive e se move, Ele (Deus)... se dignou conferir ao homem a distinção e a capacidade incomparáveis de conhecê-Lo e amá-Lo - capacidade esta que tem de ser vista como o impulso gerador e o desígnio primordial que são a base de toda a criação. ...Sobre a mais íntima realidade de cada uma das coisas criadas, Ele derramou a luz de um de Seus nomes, e fez dessa realidade receptáculo da glória de um de Seus atributos. Sobre a realidade do homem, entretanto, focalizou Ele o fulgor de todos os Seus nomes e atributos, e fê-la espelho de Seu próprio Ser. O homem, unicamente, dentre todas as coisas criadas, foi distinguido por tão grande favor, por graça tão duradoura. Essas energias com as quais... a Fonte da guia celestial dotou a realidade do homem jazem nele latentes, todavia, assim como a chama se oculta dentro da vela e os raios de luz estão presente, potencialmente, na lâmpada. O brilho dessas energias pode ser obscurecido por desejos terrenos, assim como a luz do sol pode esconder-se sob o pó e as impurezas que cobrem o espelho. Nem a vela, nem a lâmpada pode acender-se pelos próprios esforços, sem auxílio, e tampouco será possível jamais que o espelho, por si só, se livre das impurezas. É claro e evidente que antes que se ateio fogo, a lâmpada não será acesa, e a não ser que se remova de sua superfície a impureza, o espelho jamais representará a imagem do sol nem lhe poderá refletir a luz e glória. (36)
É chegado o tempo, diz Bahá’u’lláh, em que a humanidade tem tanto a capacidade como a oportunidade de contemplar o panorama inteiro de seu desenvolvimento espiritual como um processo único: "Incomparável é este Dia, pois é como os olhos para as eras e séculos passados e como a luz para a escuridão dos tempos."(37) Nesta perspectiva, os seguidores das diferentes tradições religiosas devem esforçar-se para compreender o que Ele chama de "a imutável Fé de Deus"(38) e distinguir seu impulso espiritual maior dos conselhos e leis cambiantes que foram revelados para atender às necessidades da sociedade humana, em perene evolução:
Os Profetas de Deus devem ser encarados como médicos cuja tarefa consiste em promover o bem-estar do mundo e dos povos, para que, através do espírito da unidade, possam curar a enfermidade da humanidade dividida... Não é de admirar, pois, que o tratamento prescrito pelo médico neste dia seja idêntico ao anteriormente prescrito. Como poderia ser de outro modo, se os males que afetam o paciente requerem, em cada estágio da doença, um remédio especial? Outrossim, sempre que os Profetas de Deus iluminaram o mundo com o brilho esplendoroso do Sol do conhecimento divino, eles invariavelmente, convocaram os povos a abraçar a luz de Deus pelos meios que melhor satisfizessem às exigências da era de seu advento. ...(39)
É sobretudo a mente - e não apenas o coração - que deve dedicar-se a esse processo de descoberta. A razão, assevera Bahá’u’lláh, é a maior dádiva de Deus à alma, "um sinal da revelação dAquele que é o Senhor soberano."(40) Somente se libertando de dogmas herdados, quer religiosos ou materialistas, é que a mente pode empreender uma investigação independente da relação entre a Palavra de Deus e a experiência da humanidade. Em semelhante pesquisa, o principal obstáculo é o preconceito: "Adverte... os amados do Deus uno e verdadeiro, para que não vejam com olhos demasiado críticos os dizeres e escritos dos homens. Que considerem, isto sim, esses dizeres e escritos com mente aberta e em espírito de amorosa harmonia."(41)
A Manifestação de Deus
O que é comum a quantos se devotam a um ou outro dos sistemas religiosos do mundo é a convicção de que é através da Revelação Divina que a alma entra em contato com o mundo de Deus, e de que é essa conexão que dá verdadeiro sentido à vida. Algumas das mais importantes passagens dos escritos de Bahá’u’lláh são aquelas que tratam em profundidade da natureza e do papel daqueles que são os canais dessa Revelação: os Mensageiros ou "Manifestações de Deus". Uma analogia recorrente nessas passagens é a do Sol físico. Embora este compartilhe de certas características dos demais corpos do sistema solar, difere deles por ser, ele próprio, a fonte de luz do sistema. Enquanto os planetas e luas refletem a luz, o Sol emite-a como um atributo inseparável de sua natureza. O sistema gira em torno desse ponto focal, e cada um dos astros é influenciado não apenas por sua composição específica, mas também por sua conexão com a fonte de luz do sistema. (42) Do mesmo modo, Bahá’u’lláh afirma, a personalidade humana que a Manifestação de Deus tem em comum com as demais pessoas é diferenciada delas de uma forma que a torna preparada para servir de canal ou veículo para a Revelação de Deus. As referências aparentemente contraditórias a essa condição de dualidade, atribuídas, por exemplo, a Cristo, têm constituído uma das muitas fontes de confusão e dissensão religiosa ao longo da história. Sobre essa questão, Bahá’u’lláh diz:
Qualquer coisa que esteja nos céus e qualquer coisa que esteja na terra é uma evidência direta da revelação, em seu âmago, dos atributos e nomes de Deus... Em grau supremo, é isto verdadeiro no caso do homem - aquele que, dentre todas as coisas criadas... foi escolhido para a glória de tal distinção. Pois nele se revelam, potencialmente, todos os atributos e nomes de Deus, em um grau jamais excedido por qualquer outro ser criado... E de todos os homens, os de maiores dotes, que mais se distinguem, os mais excelentes, são as Manifestações do Sol da Verdade. Não, antes, todos os demais, além dessas Manifestações, vivem pela operação de sua Vontade, movem-se e existem mediante as emanações de sua graça.(44)
Ao longo da história, a convicção dos adeptos de cada religião de que o Fundador de seu próprio credo ocupou uma posição sem par tem estimulado intensa especulação sobre a natureza das Manifestações de Deus. Tal especulação tem sido, entretanto, seriamente emaranhada pelas dificuldades de interpretar e decifrar as alusões alegóricas das escrituras do passado. A tentativa de cristalizar a opinião na forma de dogma religioso tem sido uma força mais de divisão que de união na história. Com efeito, a despeito da enorme energia despendida em estudos teológicos - ou quiçá por causa dela -, há hoje divergências profundas entre os muçulmanos quanto à posição exata de Maomé, entre os cristãos com relação a Jesus, e entre os budistas com respeito ao Fundador de sua religião. Como é notório, as controvérsias criadas por essas e outras divergências no interior de qualquer das tradições existentes têm-se mostrado ao menos tão agudas quanto as que separam cada uma delas das fés irmãs. Portanto, particularmente relevantes para a compreensão dos ensinamentos de Bahá’u’lláh sobre a unidade das religiões são Suas declarações sobre a posição dos sucessivos Mensageiros de Deus e as funções que desempenharam na história espiritual da humanidade:
Cada uma dessas Manifestações de Deus tem um grau duplo. Um é o da pura abstração e da unidade essencial. Com respeito a este, se tu os chamares a todos por um só nome e lhes atribuíres as mesmas qualiddes, não te terás desviado da verdade. ...O outro é o grau da distinção e pertence ao mundo da criação e às suas limitações. No que se refere a este, cada Manifestação de Deus tem uma individualidade diferente, uma missão definitivamente prescrita, uma revelação predestinada e limitações especialmente designadas. Cada um deles é conhecido por um nome diferente, é caracterizado por um atributo especial, cumpre uma missão bem definida. ...Vistos à luz de seu segundo grau, ... eles manifestam servitude absoluta, destituição total e abnegação completa. Assim como Ele diz: "Sou o servo de Deus. Sou apenas um homem como vós." ... Se qualquer das Manifestações de Deus - que a tudo abrangem - declarasse: "Eu sou Deus", Ele, verdadeiramente teria pronunciado a verdade, sem dúvida alguma. Pois... através de sua Revelação, seus atributos e nomes, tornaram-se manifestos no mundo a Revelação, os nomes e os atributos de Deus. ... E se qualquer deles proferisse estas palavras: "Sou o Mensageiro de Deus", também estaria dizendo a verdade, a verdade indubitável. ... Vistos a essa luz, todos eles são apenas Mensageiros daquele Rei ideal, daquela imutável Essência. ... E fossem eles dizer: "Somos os servos de Deus", isso também é um fato manifesto e incontestável; pois se manifestaram no grau máximo da servitude - servitude essa que homem algum jamais poderá atingir.(45)
Assim é que, seja qual for sua asserção - quer se refira ao reino da Divindade, ao de Senhor, ao de Profeta, de Mensageiro, Guardião, Apóstolo ou Servo - tudo é verdadeiro, acima de qualquer sobra de dúvida. Tais afirmações, portanto... devem ser consideradas atentamente, a fim de que as declarações divergentes feitas por essas Manifestações do Invisível, esses Alvoreceres da Santidade, deixem de agirar a alma e confundir a mente. (46)
"Uma Civilização que Sempre Evolua..."
Implica nesses parágrafos está a perspectiva que representa o aspecto mais desafiador da exposição de Bahá’u’lláh sobre a função da Manifestação de Deus. A Revelação Divina, diz Ele, é a força motriz da civilização. Quando ocorre, seu efeito transformador na mente e na alma dos que são tocados por ela se reproduz na nova sociedade que pouco a pouco ganha forma a partir da experiência destes. Surge um novo foco de fidelidade, capaz de conquistar o comprometimento de pessoas do mais amplo espectro de culturas; a música e as artes adotam símbolos que transmitem inspirações muito mais ricas e maduras; uma redefinição radical dos conceitos de certo e errado torna possível a formulação de novos códigos de lei e conduta civil; novas instituições são concebidas para dar expressão a impulsos de responsabilidade moral anteriormente negligenciados ou desconhecidos: "Ele estava no mundo, e o mundo foi feito por ele..."(47) A nova cultura, à medida que se desdobra em uma civilização, assimila as realizações e conceitos das eras passadas em uma profusão de novas transformações. Os traços das culturas passadas que não podem ser incorporados se atrofiam ou são mantidos por uma parcela diminuta da população. A Palavra de Deus cria novas possibilidades tanto dentro da consciência individual como no plano das relações humanas:
Cada palavra que procede dos lábios de Deus é dotada de tal potência que pode instilar vida nova em todo corpo humano... Todas as maravilhosas obras que vedes neste mundo foram manifestas mediante a operação de Sua suprema e excelentíssima Vontade, Seu Desígnio maravilhoso o inflexível. ...Mal se pronuncia esta palavra resplandecente, e suas energias animadoras, vibrando dentro de todas as coisas criadas, dão origem aos meios e instrumentos pelos quais essas artes podem ser produzidas e aperfeiçoadas. ...Nos dias vindouros, contemplareis, verdadeiramente, coisas das quais jamais soubestes. ... Cada uma das letras que procede dos lábios de Deus é, em verdade, uma letra-mãe; toda palavra proferida por Aquele que é o Manancial da Revelação Divina é uma palavra-mãe.(48)
A seqüência das Revelações Divinas, o Báb assevera, é "um processo que não teve início e não terá fim."(49) Embora a missão de cada uma das Manifestações de Deus esteja limitada no tempo e nas funções que desempenha, é parte integrante de um desdobramento contínuo e progressivo do poder e da vontade de Deus:
Contempla tu com a vista interior a cadeia de sucessivas Revelações que ligou a Manifestação de Adão à do Báb. Dou testemunho perante Deus de que cada uma dessas Manifestações foi enviada através da operação da Vontade e Desígnio divinos, cada uma foi portadora de uma Mensagem específica e a cada qual se confiou um Livro divinamente revelado... A medida da Revelação com a qual cada um dEles se identificava fora definitivamente preordenada.(50)
Ao final de um longo período, à medida que uma civilização em perene evolução esgota suas fontes espirituais, tem início um processo de desintegração semelhante ao que se observa por todo o mundo fenomenal. Voltando novamente às analogias oferecidas pela natureza, Bahá’u’lláh compara esse hiato no desenvolvimento da civilização à chegada do inverno. A vitalidade moral definha, assim como a coesão social. Desafios que teriam sido superados em uma era anterior, ou convertidos em oportunidades para investigação e progresso, tornam-se barreiras intransponíveis. A religião perde a relevância, e a experimentação torna-se progressivamente fragmentária, aprofundando ainda mais as divisões sociais. As incertezas quanto ao significado e ao valor da vida geram cada vez mais angústia e confusão. Falando desse estado de coisas de nossos tempos, Bahá’u’lláh diz:
Podemos bem perceber como a humanidade inteira está cercada de grandes, de incalculáveis aflições. Nós a vemos languecer no leito da doença, angustiada e desiludida. Os que estão embriagados de arrogância interpuseram-se entre ela e o infalível Médico Divino. Vede como envolveram todos os homens, inclusive a si mesmos, no enredo de suas maquinações. Não são capazes de descobrir a causa da enfermidade, nem possuem conhecimento algum do remédio. Conceberam o direito como torto e imaginaram que o amigo fosse um inimigo.(51)
Quando cada um dos impulsos divinos se consuma, o processo se repete. Uma nova Manifestação de Deus surge, trazendo uma medida mais ampla de inspiração divina para a próxima etapa do despertar e da educação da humanidade:
Considera a hora em que a suprema Manifestação de Deus Se revela aos homens. Antes de vir tal hora, o Ser Antigo, que é ainda desconhecido dos homens e não deu expressão ainda ao Verbo de Deus é, Ele próprio, o Onisciente, em um mundo destituído de qualquer homem que O tenha conhecido. Ele é, em verdade, o Criador sem criação... É este, verdadeiramente, o Dia sobre o qual foi escrito: "De quem será o Reino neste Dia?" E não se encontra ninguém pronto a responder! (52)
Até que uma porção da humanidade comece a se mostrar sensível à nova Revelação, e um novo paradigma social e espiritual adquira os primeiros contornos, as pessoas subsistem moral e espiritualmente dos últimos vestígios e das dádivas divinas de eras anteriores. As tarefas rotineiras da sociedade podem ser executadas ou não; as leis podem ser cumpridas ou escarnecidas; a experimentação social e política pode inflamar-se ou extinguir-se; mas as raízes da fé - sem a qual sociedade alguma resiste indefinidamente - estão exauridas. No "final dos tempos", no "fim do mundo", as pessoas de consciência espiritual começam a volver-se novamente à Fonte Criativa. Por mais vacilante ou perturbador que possa ser o processo, por toscas ou infelizes que sejam algumas das opções consideradas, tal busca é uma resposta instintiva à percepção de que um abismo imenso abriu-se na vida ordenada da humanidade. (53) Os efeitos da nova Revelação, diz Bahá’u’lláh, são universais, e não se restringem à vida e aos ensinamentos da Manifestação de Deus que é o ponto focal da Revelação. Embora não compreendidos, esses efeitos permeiam gradativamente os assuntos humanos, revelando as contradições existentes nas crenças das pessoas e na sociedade e intensificando a busca de compreensão. A sucessão das Manifestações é uma dimensão inseparável da existência, declara Bahá’u’lláh, e haverá de prosseguir por todo o sempre: "Deus tem enviado Seus Mensageiros para sucederem a Moisés e Jesus e continuará a fazê-lo até ‘o fim que não tem fim’...(54)
Dia de Deus
O que Bahá’u’lláh considera ser a meta da evolução da consciência humana? Na perspectiva da eternidade, seu fito é que Deus veja, de forma cada vez mais clara, Suas perfeições refletidas no espelho de Sua criação, e, nas palavras de Bahá’u’lláh,
...todo homem possa dar testemunho, em si mesmo e por si próprio, no grau da Manifestação do seu Senhor, de que, em verdade, não há Deus salvo Ele, e todos os homens possam assim alcançar o cume das realidades, até que nenhum deles contemple coisa alguma, seja o que for, sem nela ver a Deus. (55)
No contexto da história da civilização, o objetivo da sucessão de Manifestações Divinas tem sido preparar a consciência humana para a unificação do gênero humano como uma única espécie; na verdade, como um organismo único capaz de assumir a responsabilidade sobre o próprio futuro coletivo: "Aquele que é o vosso Senhor, o Todo Misericordioso," - diz Bahá’u’lláh - "acalenta no coração o desejo de contemplar a raça humana inteira como uma só alma e um só corpo."(56) Enquanto não reconhecer a própria unidade orgânica, a humanidade não terá como enfrentar sequer os desafios imediatos, quanto mais os que se encontram à frente: "O bem-estar da humanidade", insiste Bahá’u’lláh, "sua paz e segurança são inalcançáveis, a não ser que, primeiro, se estabeleça firmemente sua unidade." (57) Somente uma sociedade global unificada poderá assegurar a seus filhos o sentimento de confiança íntima implícita em uma das preces de Bahá’u’lláh a Deus: "Qualquer dever que Tu tenhas prescrito aos Teus servos de exaltar ao máximo Tua majestade e glória é tão-somente um sinal de Tua graça a eles, para que possam ascender à posição concedida ao seu ser mais íntimo, à posição do conhecimento de seu próprio ser. (58) Paradoxalmente, só atingindo a verdadeira unidade é que a humanidade poderá cultivar em plenitude a própria diversidade e individualidade. Essa é a meta à qual as missões de todas as Manifestações de Deus conhecidas da história têm servido: o Dia de "um só rebanho e um só pastor". (59) Sua realização, Bahá’u’lláh afirma, é o estágio de civilização no qual a humanidade está ingressando agora. Uma das analogias mais sugestivas encontradas nos escritos de Bahá’u’lláh, como nos do Báb antes Dele, é a comparação da evolução do gênero humano com a vida do ser humano enquanto indivíduo. Em seu desenvolvimento coletivo, a humanidade tem crescido em estágios sucessivos que lembram os períodos de infância, puberdade e adolescência do processo de amadurecimento de cada um de seus membros. Estamos vivendo agora as primícias de nossa maturidade coletiva, dotados de novas capacidades e oportunidades, das quais temos ainda mui pálida consciência. (60) Em fase disso, não é difícil compreender a prioridade que o princípio da unidade recebe nos ensinamentos de Bahá’u’lláh. A unidade da humanidade é o motivo condutor da era que agora alvorece, o padrão segundo o qual cumpre examinar todas as propostas de aperfeiçoamento humano. Existe, reitera Bahá’u’lláh, uma única raça humana; as noções herdadas de que determinada raça ou grupo étnico é de alguma forma superior ao restante da humanidade são infundadas. Outrossim, uma vez que todos os Mensageiros de Deus têm atuado como agentes da mesma Vontade Divina, suas revelações constituem o legado coletivo da raça humana como um todo; cada pessoa na Terra é herdeira legítima da totalidade dessa tradição espiritual. Persistir em preconceitos de qualquer natureza é prejudicial aos interesses da sociedade e representa uma violação à Vontade de Deus para nossa época:
Ó povos e raças da Terra que estais em contenda! Volvei a face à unidade e deixai brilhar sobre vós o esplendor de sua luz. Uni-vos, e por amor a Deus resolvei extirpar qualquer coisa que motive conflito entre vós... Não pode haver dúvida alguma de que os povos do mundo, qualquer que seja sua raça ou religião, colhem inspiração de uma só Fonte Celestial e são súditos de um só Deus. A diferença entre os preceitos sob os quais vivem deve ser atribuída aos diferentes requisitos e exigências da época em que foram revelados. Todos esses mandamentos, excetuando-se apenas alguns poucos que resultam da perversidade humana, foram ordenados por Deus e são um reflexo de Sua Vontade e Seu Propósito. Levantai-vos, e armados do poder da fé, demoli os deuses de vossas imaginações vãs, semeadoras que são de dissensão entre vós... (61)
O tema da unidade permeia os escritos de Bahá’u’lláh: "Ergueu-se o tabernáculo da unidade; não vos considereis uns aos outros como estranhos." (62) Convivei com os seguidores de todas as religiões em espírito de amizade e camaradagem."(63) "Sois os frutos de uma só árvore, as folhas do mesmo ramo." (64)
O processo de maturação da humanidade tem avançado no bojo da evolução da organização social. Começando com a unidade familiar e suas várias extensões, a raça humana tem desenvolvido, com graus variáveis de sucesso, sociedades baseadas no clã, na tribo, na cidade-estado e, mais recentemente, na nação. Esse meio social progressivamente mais amplo e complexo proporciona ao potencial humano tanto o estímulo como o espaço para desenvolver-se, e esse desenvolvimento, por sua vez, tem induzido renovadas modificações na estrutura social. O advento da maturidade da humanidade, portanto, deve produzir uma total transformação da ordem social. A nova sociedade deve ser capaz de englobar toda a diversidade do gênero humano e beneficiar-se de toda a gama de talentos e conhecimentos que milênios de experiência cultural têm refinado:
Este é o Dia em que os mais excelentes favores de Deus manaram sobre os homens, o Dia em que Sua graça suprema se infundiu em todas as coisas criadas. Todos os povos do mundo devem reconciliar suas discordâncias e, em paz e união perfeitas, abrigar-se à sombra da Árvore de Seu cuidado e terna bondade... Breve será a presente ordem posta de lado, e uma nova estender-se-á em seu lugar. Deveras, teu Senhor diz a verdade e é o Conhecedor das coisas invisíveis. (65)
O principal instrumento para a transformação da sociedade e para a realização da unidade mundial, assegura Bahá’u’lláh, é o estabelecimento da justiça nos assuntos da humanidade. Esta questão tem grande relevo em Seus ensinamentos.
A luz dos homens é a Justiça. Não a apagueis com os ventos contrários da opressão e tirania. O objetivo da justiça é fazer aparecer entre os homens a unidade. O oceano da sabedoria divina encapela-se dentro desta palavra excelsa, ao passo que os livros do mundo não podem conter seu significado mais íntimo... (66)
Em Seus escritos posteriores, Bahá’u’lláh explicitou as implicações desse princípio para a era da maturidade humana. "Mulheres e homens têm sido e hão de ser sempre iguais aos olhos de Deus," (67) acentua Ele, e o processo da civilização exige que a sociedade organize seus assuntos de forma tal que dê plena expressão a esse fato. Os recursos da Terra são propriedade de toda a humanidade, e não de um povo ou outro. As diferentes contribuições para o bem-estar econômico comum merecem e devem receber medidas diferentes de recompensa e reconhecimento, mas os extremos de riqueza e pobreza que afligem a maioria das nações da Terra, independente das filosofias sócio-econômicas que professam, têm de ser abolidos.
Proclamação aos Reis
Os escritos supracitados foram revelados, na maior parte, sob condições de constantes perseguição. Logo depois da chegada dos exilados a Constatinopla, tornou-se claro que as honrarias prestadas em abundância a Bahá’u’lláh durante a viagem desde Bagdá haviam apresentado não mais que um breve interlúdio. A decisão das autoridades otomanas de levar o líder "babísta" e Seus companheiros à capital do império, e não a alguma província remota, alarmou ainda mais os representantes do governo persa. (68) Temendo que os acontecimentos de Bagdá se repetissem, quiçá atraindo desta vez não só a simpatia, mas até mesmo a adesão de figuras influentes do governo turco, o embaixador da Pérsia fez insistentes pressões pela transferência dos exilados a alguma região mais remota do império. Seu argumento era o de que a divulgação de uma nova mensagem religiosa na capital poderia produzir repercussões tanto políticas como religiosas. Inicialmente, o governo otomano resistiu fortemente. O primeiro-ministro, ‘Alí-Páshá, havia manifestado a diplomatas ocidentais a opinião de que Bahá’u’lláh era "um homem da maior distinção, de conduta exemplar e grande moderação, uma figura nobílima." Seus ensinamentos eram, do ponto de vista do primeiro-ministro, "dignos de alta estima", pois contrapunham-se às animosidades religiosas que dividiam os súditos judeus, cristãos e muçulmanos do império. (69) Aos poucos, porém, começaram a surgir ressentimentos e suspeitas. Na capital otomana, o poder político e econômico estava nas mãos de funcionários da corte que, com raras exceções, eram pessoas de pouca ou nenhuma competência. A venalidade era o lubrificante com o qual a maquinaria do governo funcionava, e a capital era um ímã para a horda de pessoas que para lá acorriam, de todas as partes do império e além, em busca de favores e influência. Esperava-se de qualquer figura proeminente de outro país ou de algum dos territórios ocupados que, imediatamente após chegar a Constantinopla, se juntasse à multidão de pedintes de favores que se aglomeravam nas ante-salas do paxás e ministros da corte imperial. Ninguém gozava de pior reputação que os grupos concorrentes de exilados persas, conhecidos que eram já pela astúcia, já pela falta de escrúpulos. Para a aflição dos amigos que insistiam para que Ele tirasse partido da hospitalidade reinante contra o governo persa e da solidariedade que Seus próprios sofrimentos haviam despertado, Bahá’u’lláh deixou claro que não tinha nada a solicitar. Embora vários ministros do governo Lhe fizessem visitas sociais na residência que Lhe fora determinada, Ele não Se aproveitou dessas oportunidades. Estava em Constantinopla, dizia, como hóspede do Sultão, a seu convite, e Seu interesse estava em assuntos espirituais e morais. Muitos anos mais tarde, o embaixador persa, Mírzá Husayn Khán, refletindo sobre o período em que serviu na capital otomana, e queixando-se dos danos que a ganância e a perfídia de seus compatriotas causaram à reputação da Pérsia em Constantinopla, prestou um tributo surpreendentemente sincero e imparcial ao exemplo que a conduta de Bahá’u’lláh fora capaz de estabelecer durante Sua breve estada na cidade. (70) À época, porém, o embaixador e seus colegas valeram-se da situação para apresentá-la como uma forma astuta da parte do exilado de camuflar conspirações secretas contra a segurança pública e contra a religião do Estado. Sob a pressão dessas influências, os governantes otomanos finalmente tomaram a decisão de transferir Bahá’u’lláh com a família para a cidade provincial de Adrianopla. A mudança foi feita às pressas, no auge de um inverno extremamente rigoroso. Alojados em construções impróprias em Adrianopla, e carecendo de vestes adequadas e outras provisões, os exilados passaram um ano de grandes sofrimentos. Era óbvio que, embora sem serem acusados de crime algum, e sem oportunidade de se defender, eles, arbitrariamente, haviam sido feitos prisioneiros de estado. Do ponto de vista da história religiosa, os sucessivos banimentos de Bahá’u’lláh para Constantinopla e Adrianopla encerram um simbolismo notável. Pela primeira vez, uma Manifestação de Deus, o Fundador de um sistema religioso independente que em pouco tempo se disseminaria por todo o planeta, cruzara a estreita faixa de água que separa a Ásia da Europa e pisara em "solo ocidental." Todas as outras grandes religiões haviam surgido na Ásia , e os ministérios de seus Fundadores ficaram restritos àquele continente. Referindo-se ao fato de que as dispensações do passado, e particularmente as de Abraão, Cristo e Maomé, produziram seus efeitos mais importantes sobre o desenvolvimento da civilização durante o curso de sua expansão para o Ocidente, Bahá’u’lláh predisse que o mesmo iria ocorrer nesta nova era, porém em escala muito maior: "No Oriente, a Luz de Sua Revelação surgiu; no Ocidente, os sinais de Seu domínio apareceram. Ponderai isto no coração, ó povos..." (71) Não é de surpreender, por conseguinte que Bahá’u’lláh tenha escolhido este momento para tornar pública a missão que vinha pouco a pouco conquistando a adesão dos seguidores do Báb em todo o Oriente Médio. Sua proclamação teve a forma de uma série de declarações que se situam em os mais extraordinários documentos da história da religião. Nelas, a Manifestação de Deus dirigi-se aos "Reis e Governantes do Mundo", anunciando-lhes o alvorecer do Dia de Deus, aludindo às transformações até então inconcebíveis que ganhavam ímpeto por todo o planeta e convocando-os, como fideicomissários de Deus e de seus semelhantes, a erguerem-se e servirem ao processo de unificação da raça humana. Graças à veneração que lhes votava a massa dos súditos, e em razão da natureza absoluta do poder que a maioria deles exercia, estava ao seu alcance, dizia Bahá’u’lláh, contribuir para o estabelecimento que se chamou a "Paz Máxima", uma ordem mundial caracterizada pela unidade e animada pela justiça divina. É extremamente difícil para o leitor moderno ter uma idéia do mundo moral e intelectual no qual viviam esses monarcas do século passado. De suas biografias e de sua correspondências particular depreende-se terem sido, com poucas exceções, pessoas devotas, detentoras de papéis principais na vida espiritual das respectivas nações, em geral como dirigentes da religião do Estado e convictos das verdades infalíveis da Bíblia e do Alcorão. O poder que exerciam, atribuíam-no diretamente à autoridade divina de passagens dessas mesmas escrituras, autoridade essa que defendiam com vigor e eloqüência. Eles eram os ungidos de Deus. As profecias sobre "Os Últimos Dias" e "O Reino de Deus", para esses soberanos, não eram mito ou alegoria, mas certezas sobre as quais toda a ordem moral repousava e segundo as quais eles próprios seriam chamados por Deus a prestar contas de suas responsabilidades. As epístolas de Bahá’u’lláh dirigem-se ao mundo dessa mentalidade:
Ó Reis da Terra! Veio Aquele que é o Senhor soberano de todos. O Reino é de Deus, o Protetor Onipotente, O que subsiste por Si próprio. ...Esta é uma Revelação à qual coisa alguma que possuís jamais poderá ser comparada - pudésseis ao menos o saber. ...Acautelai-vos para que o orgulho não vos detenha de reconhecer a Fonte da Revelação, para que as coisas deste mundo não vos excluam, como que por um véu, Daquele que é o Criador do céu... Pela retidão de Deus! Não nutrimos o desejo de apoderar-Nos de vossos reinos. É nossa missão conquistar e possuir o coração dos homens... (72) Sabei que os pobres são a incumbência de Deus em vosso meio. Cuidai para não trairdes Sua incumbência, para não os tratardes com injustiça nem seguirdes os caminhos dos traiçoeiros. Com absoluta certeza, havereis de responder por Sua incumbência no dia em que for ajustada a Balança da Justiça, no dia em que cada um receberá o que merece e pesar-se-ão os atos de todos os homens, sejam ricos ou pobres... Examinai Nossa Causa, informando-vos das coisas que Nos sobrevieram e decidindo com justiça entre Nós e Nossos inimigos, e sede dos que tratam o próximo com eqüidade. Se não detiverdes a mão do opressor, se deixardes de salvaguardar os direitos dos espezinhados, que direito tereis, então, de vos ufanar entre os homens?... (73) Se não atenderdes aos conselhos que Nós vos revelamos nesta Epístola...o castigo divino haverá de atacar-vos de todos os lados, e a sentença de Sua justiça será pronunciada contra vós. Naquele dia, não tereis o poder de Lhe resistir e reconhecereis vossa própria incapacidade...(74)
A visão da "Paz Máxima" não despertou resposta alguma da parte dos governantes do século XIX. O engrandecimento nacionalista e a expansão imperial recrutavam não somente reis como parlamentares, acadêmicos, artistas, jornais e as principais instituições religiosas como propagandistas entusiásticos do triunfalismo ocidental. As propostas de transformação social, embora altruístas e idealistas, eram rapidamente tragadas por um turbilhão de novas ideologias geradas pela maré crescente de materialismo dogmático. No Oriente, hipnotizado por sua pretensão de representar tudo o que a humanidade jamais poderia ou iria conhecer de Deus e da verdade, o mundo islâmico submergia cada vez mais profundamente na ignorância, na letargia e numa hostilidade ressentida à raça humana, a qual era incapaz de reconhecer essa preeminência espiritual.
A Chegada na Terra Santa
Em vista dos fatos ocorridos em Bagdá, parece surpreendente não terem as autoridades otomanas previsto o que resultaria do estabelecimento de Bahá’u’lláh em outra importante capital provincial. Um ano após Sua chegada a Adrianopla, o prisioneiro atraíra primeiro o interesse e então a ardorosa admiração de personalidades proeminentes tanto da vida intelectual como governamental da região. Para o desgosto dos representantes consulares persas, dois dos mais devotados desses admiradores eram Khurshíd Páshá, o governador da província, e o Shaykhu’l-Islám, o principal dignatário religioso sunita. Aos olhos de Seus anfitriões e do público em geral, o exilado era um filósofo e santo honrado, e a validade de Seus ensinamentos refletia-se não apenas no exemplo de Sua própria vida, mas também nas transformações que efetuavam na torrente de peregrinos persas que fluíam àquela remota cidade do Império Otomano para visitá-Lo. (75) Esses desdobramentos inesperados convenceram o embaixador persa e seus colegas de que seria apenas uma questão de tempo para que o movimento bahá’í, em contínua expansão na Pérsia, se estabelecesse como uma força preponderante no império vizinho e rival. Em todo esse período de sua história, o destroçado Império Otomano lutava contra repetidas incursões da Rússia czarista, levantes entre os próprios súditos e tentativas persistentes dos governos britânicos e austríaco, aparentemente amigos, de desmembrar vários territórios turcos e incorporá-los aos seus próprios impérios. Essa situação política instável das províncias européias da Turquia fornecia novos e prementes argumentos em apoio ao apelo do embaixador para que os exilados fossem enviados a uma colônia distante, onde Bahá’u’lláh já não tivesse contato com círculos influentes, quer turcos ou ocidentais. Quando o chanceler da Turquia, Fu’ád Páshá, regressou de uma visita a Adrianopla, seu relato pasmo sobre a reputação que Bahá’u’lláh conquistara em toda a região pareceu dar credibilidade às insinuações da embaixada persa. Nesse clima de opinião, o governo decidiu abruptamente submeter seu hóspede a um confinamento rigoroso. Sem aviso prévio, um dia, bem cedo, a casa de Bahá’u’lláh foi cercada por soldados, e os exilados receberam ordens de preparar-se para partir com destino ignorado. O lugar escolhido para esse banimento final foi a soturna cidade-fortaleza de ‘Akká (Acre), no litoral da Terra Santa. Famigerada em todo o império pela repugnância do clima e por ser foco de muitas doenças, ‘Akká era uma colônia penal utilizada pelo Estado Otomano para o encarceramento de criminosos perigosos, na expectativa de que não sobreviveriam por muito tempo naquela prisão. Tendo chegado em agosto de 1868, Bahá’u’lláh, os membros de Sua família e um grupo de seguidores que haviam sido exilados com Ele iriam passar dois anos de sofrimento e maus-tratos dentro da própria fortaleza, para então serem confinados em prisão domiciliar em um prédio nas proximidades, de propriedade de um comerciante local. Por um longo tempo, a supersticiosa população local evitou os exilados, advertida que fora em sermões públicos contra "o Deus dos persas", retratado como inimigo da ordem pública e autor de idéias blasfemas e imorais. Vários membros do pequeno grupo de exilados morreram por causa das privações e outras condições às quais foram sujeitados. (76) Observando em retrospecto, parece uma aguda ironia que a escolha da Terra Santa como o lugar do confinamento forçado de Bahá’u’lláh tenha resultado da pressão de inimigos eclesiásticos e civis cujo objetivo era extinguir Sua influência religiosa. A Palestina, reverenciada por três das maiores religiões monoteístas como o ponto de interseção entre os mundos de Deus e do homem, ocupava então, como ocupara por milhares de anos, uma posição única nas expectativas humanas. Não mais que algumas semanas antes da chegada de Bahá’u’lláh, a cúpula do Movimento Templário Protestante alemão partia da Europa para estabelecer, no sopé do Monte Carmelo, uma colônia que tinha o intuito de receber a Cristo, cujo advento considerava iminente. Sobre os dintéis de muitas das pequenas casas que construíram, voltadas, do outro lado da baía, para a prisão de Bahá’u’lláh em ‘Akká, podem-se encontrar, ainda hoje, inscrições gravadas tais como Der Herr ist nahe ("O Senhor está próximo). (77) Em ‘Akká, Bahá’u’lláh continuou a ditar uma série de epístolas endereçadas individualmente a diversos governantes, algo que iniciara em Adrianopla. Várias delas continham advertências sobre o juízo de Deus com relação a sua negligência e desgoverno, advertências essas cuja dramática concretização provocou intensa discussão pública em todo o Oriente Próximo. Menos de dois meses após a chegada dos exilados à cidade-prisão, por exemplo, Fu’ád Páshá, o ministro das Relações Exteriores otomano, cujas informações distorcidas concorreram para precipitar a deportação, foi subitamente exonerado do posto e morreu na França, vítima de ataque cardíaco. O evento foi assinalado por uma declaração que previa a demissão prematura de seu colega, o primeiro-ministro ‘Alí Páshá, a deposição e morte do Sultão e a perda dos territórios turcos na Europa, uma série de desastres que se sucederam um após o outro. (78) A epístola ao imperador Napoleão III advertia-o de que, em virtude de sua insinceridade e abuso do poder, "prevalecerá confusão em teu reino, e teu império passar-te-á das mãos, como punição pelo que tens feito... Terá tua pompa te tornado orgulhoso? Por Minha vida! Não durará..."(79) Sobre a desastrosa Guerra Franco-Prussiana e a conseqüente derrubada de Napoleão III, ocorrida menos de um ano após essa declaração, Alistair Horne, um erudito moderno da história política da França do século XIX, escreveu: A História talvez não registre exemplo mais chocante do que os gregos chamavam de peripéteia, a terrível quedas das alturas do orgulho. É certo que nenhuma nação nos tempos modernos, tão plena de grandeza notória e opulenta em conquistas materiais, foi jamais submetida a pior humilhação em tão curto espaço de tempo. (80)
Apenas alguns meses antes da inesperada série de fatos na Europa que levavam à invasão dos Estados Papais e à anexação de Roma pelas forças do novo Reino da Itália, uma declaração dirigida ao Papa Pio IX exortava o Sumo Pontífice: "Abandona teu reino aos reis e emerge de tua habitação, com a face volvida para o Reino... Sê tu como tem sido teu Senhor... Em verdade, o dia da colheita é chegado, e todas as coisas foram separadas uma da outra. Ele guardou o que escolheu nos vasos da justiça e lançou ao fogo o que disso era digno..." (81)
Guilherme I, rei da Prússia, cujos exércitos haviam conquistado tão avassaladora vitória na Guerra Franco-Prussiana, fora advertido por Bahá’u’lláh no Kitáb-i-Aqdas a considerar o exemplo da queda de Napoleão III e de outros potentados que haviam sido vitoriosos na guerra, e a não permitir que o orgulho o impedisse de reconhecer Sua Revelação. O fato de que Bahá’u’lláh vaticinou que o imperador alemão não chegaria a responder a essa advertência é demonstrado pela ominosa passagem que aparece adiante no mesmo Livro: Ó margens do Reno! Nós vos vimos cobertas de sangue, porque as espadas da retribuição foram desembainhadas contra vós; e tereis ainda outro turno. E ouvimos os lamentos de Berlim, embora viva hoje em glória conspícua. (82) Um tom radicalmente diferente caracteriza dois dos principais pronunciamentos, o dirigido à Rainha Vitória (83) e o endereçado aos "Governantes da América e Presidentes de suas Repúblicas". O primeiro elogia o avanço pioneiro representado pela abolição da escravatura em todo o Império Britânico e louva o princípio do governo representativo. O segundo, que é aberto com o anúncio do Dia de Deus, conclui com um chamamento, um virtual mandato, sem paralelo em qualquer das outras mensagens: "Recomponde o roto com as mãos da justiça, e esmagai o opressor que prospera com a vara dos mandamentos de vosso Senhor, o Governante, a Suprema Sabedoria." (84)
A Religião Como Luz e Treva
A condenação mais severa de Bahá’u’lláh é reservada às barreiras que, ao longo da história, a religião organizada ergueu entre a humanidade e as Revelações de Deus. Os dogmas, inspirados pela superstição popular e aperfeiçoados pelo desperdício intelectual, têm sido repetidamente impostos a um processo divino cujo propósito tem sido sempre espiritual e moral. As leis de interação social, reveladas com o fito de consolidar a vida comunitária, têm sido utilizadas como base de estruturas de doutrina e prática arcanas que têm oprimido as massas a cujo benefício deveriam servir. Mesmo o exercício do intelecto, a ferramenta precípua de que dispõe a raça humana, tem sido deliberadamente dificultado, levando ao colapso afinal, o diálogo entre a fé e ciência, do qual depende a vida civilizada. A conseqüência desse registro lamentável é o descrédito em que caiu a religião em todo o mundo. Pior ainda, a religião organizada tornou-se ela própria uma das mais virulentas causas de ódio e luta armada entre os povos. "O fanatismo e o ódio religiosos", advertiu Bahá’u’lláh há mais de um século, "são um fogo devorador do mundo, cuja violência ninguém pode conter. A Mão do poder divino, tão somente, é capaz de livrar a humanidade dessa aflição desoladora." (85) Os líderes religiosos da humanidade, afirma Bahá’u’lláh, é que serão responsabilizados por Deus por essa tragédia, eles que se têm arvorado em porta-vozes de Deus ao longo de toda a história. Suas tentativas de fazer da Palavra de Deus uma relíquia particular, e de sua exposição um instrumento de engrandecimento pessoal, têm sido o maior empecilho que o avanço da civilização tem enfrentado. Para alcançar seus objetivos, muitos deles não hesitaram em erguer a mão contra os próprios Mensageiros de Deus, por ocasião de seu advento: Os expoentes da religião, em todas as eras, têm impedido o povo de atingir as praias da salvação eterna, por haverem segurado firmemente as rédeas da autoridade em suas poderosas mãos. Alguns por sede de poder, outros por falta de conhecimento e compreensão, privaram o povo desse bem. Por sua autoridade e sanção, todo Profeta de Deus sorveu do cálice do sacrifício... (86) Dirigindo-se aos clérigos de todas as fés, Bahá’u’lláh adverte-os da responsabilidade que tão desatentamente assumiram na história: Sois como uma nascente. Se for alterada, o mesmo se dará com os rios que dela brotam. Temei a Deus, e sede dos justos. Do mesmo modo, se o coração do homem for corrompido, seus membros também o serão. E, semelhantemente, se a raiz de uma árvore for corrompida, seus galhos e ramos e folhas e frutos serão também corrompidos. (87) Essas mesmas declarações, reveladas em uma época na qual a ortodoxia religiosa era um dos principais poderes em todo o mundo, afirmavam que tal poder efetivamente terminara e a casta eclesiástica já não tinha nenhum papel social na história humana. "Ó congregação de sacerdotes! Doravante não vos vereis detentores de poder algum..." (88) A um oponente especialmente vingativo, membro do clero muçulmano, Bahá’u’lláh asseverou: "És assim como o último traço de luz solar que toca o cume da montanha. Em breve se desvanecerá, conforme decretado por Deus, o Possuidor de tudo, o Altíssimo. Tua glória e a glória daqueles que são como tu foram tiradas..." (89) Não é à organização da atividade religiosa que essas declarações se referem, mas ao mau uso de tais recursos. Os escritos de Bahá’u’lláh são generosos no apreço não somente pela grande contribuição que a religião organizada trouxe à civilização, mas também pelos benefícios que o mundo tem auferido da abnegação e do amor à humanidade que têm caracterizado as ordens religiosas e os clérigos de todas as fés: Aqueles sacerdotes... que verdadeiramente se adornam com o ornamento do conhecimento e de um caráter virtuoso são, deveras, como a cabeça para o corpo do mundo, e como os olhos para as nações... (90) Na realidade, o desafio de todos, crentes ou não, sacerdotes ou leigos, é reconhecer as conseqüências que hoje afligem o mundo em virtude da corrupção universal do impulso religioso. Com o afastamento da humanidade de Deus, predominante desde o século passado, rompeu-se a relação da qual depende a própria estrutura da vida moral. As faculdades inerentes à alma racional, vitais ao desenvolvimento e à manutenção dos valores humanos, têm sido universalmente menosprezadas: A vitalidade da crença dos homens em Deus esmorece em todas as terras; nada senão Seu remédio salutar jamais a poderá restaurar. A corrosão da irreligiosidade carcome as vísceras da sociedade humana; que outra coisa senão o Elixir de Sua potente Revelação poderá purificá-la e revivificá-la?... O Verbo de Deus, tão-somente, pode pretender a distinção de estar dotado da capacidade necessária para uma transformação de tal magnitude e de tamanho alcance. (91)
A Paz Mundial
À luz dos acontecimentos posteriores, as admoestações e apelos contidos nos escritos de Bahá’u’lláh desse período afiguram-se profundamente pungentes: Ó vós, representantes eleitos do povo em todas as terras!... Considerai o mundo como o corpo humano, que, embora tenha sido criado são e perfeito, tem sido afligido, por várias causas, de graves desordens e doenças. Nem por um só dia teve alívio; ao contrário, sua enfermidade tornou-se mais severa, pois foi entregue ao tratamento de médicos ignorantes, que deram total vazão aos seus desejos pessoais... Nós o observamos, neste dia, à mercê de governantes tão embriagados de orgulho que não são capazes de discernir claramente o que lhes é melhor, muito menos de reconhecer uma Revelação tão desconcertante e desafiadora como esta... (92) Este é o Dia em que a Terra fará ressoar suas novas. Os obreiros da iniqüidade são seu fardo - pudésseis vós apenas o perceber... (93) Todos os homens foram criados a fim de levar avante uma civilização que sempre evolua. O onipotente dá-Me testemunho: Agir como os animais do campo é indigno do homem. As virtudes condizentes com sua dignidade são a tolerância, a mercê, a compaixão e a bondade para com todos os povos e raças da Terra... (94) Uma vida nova, nesta era, está vibrando em todos os povos da Terra; contudo, ninguém lhe descobriu a causa nem percebeu o motivo. Considerai os povos do Ocidente. Vede como, em busca daquilo que é vão e insignificante, têm sacrificado e ainda sacrificam incontáveis vidas por seu estabelecimento e promoção... (95) Em todos os assuntos, a moderação é desejável. Se uma coisa for levada ao excesso, provará ser fonte de mal... Coisas estranhas e espantosas existem na Terra, mas se ocultam da mente e da compreensão dos homens. Tais coisas são capazes de alterar toda a atmosfera da Terra, e sua contaminação mostrar-se-ia letal..." (96) Em escritos posteriores, inclusive nos dirigidos à humanidade como um todo, Bahá’u’lláh enfatizou a premência da adoção de medidas direcionadas ao que chamou de a "Grande Paz". Essas medidas, disse atenuariam os sofrimentos e transtornos que antevia para o gênero humano até que os povos do mundo abraçassem a Revelação de Deus e, por meio dela realizassem a Paz Máxima: Haverá de chegar o tempo em que a necessidade imperiosa da convocação de uma vasta e ampla assembléia de homens será universalmente percebida. Os governantes e os reis da Terra terão de tomar parte dela e, participando de suas deliberações, deverão considerar métodos e meios capazes de assentar os fundamentos para a Grande Paz, mundial, entre os homens. Tal paz requer que as grandes potências resolvam, a bem da tranqüilidade dos povos da Terra, reconciliar-se plenamente entre si. Se algum rei pegar em armas contra outro, todos, unidos, devem erguer-se e detê-lo Se isso for feito, as nações do mundo não mais precisarão de armamentos, exceto para preservar a segurança de seus domínios e manter a ordem interna dentro do próprio território... Aproxima-se o dia em que todos os povos do mundo terão adotado um idioma universal e uma escrita comum. Quando isso for realizado, não importa a que cidade um homem viaje, será como estivesse entrando no próprio lar. ...É homem, verdadeiramente, quem hoje se dedica ao serviço da humanidade inteira. ...Não se vanglorie quem ama a pátria, mas sim, quem ama o mundo inteiro. A Terra é um só país, e os seres humanos, seus cidadãos. (97)
"Não por Minha Própria Vontade"
Em Sua epístola a Násiri’d-Dín Sháh, o rei da Pérsia, a qual não contém nenhuma censura por Seu encarceramento no Síyáh-Chál ou pelas outras injustiças que sofreu nas mãos do monarca, Bahá’u’lláh fala do próprio papel no Plano Divino: Eu era apenas um homem como os outros, adormecido em Meu leito, quando eis que as brisas do Todo Glorioso manaram sobre Mim e deram-Me o conhecimento de tudo o que já existiu. Isto não provém de Mim, mas de Um que é Todo Poderoso e Onisciente. E Ele ordenou que Eu erguesse a voz entre a Terra e o céu, e por isso Me sobreveio o que fez correr as lágrimas de todo homem de compreensão. A erudição comum entre os homens, não a estudei; nem freqüentei suas escolas. Pergunta na cidade onde residi, a fim de teres a certeza de que Eu não sou dos que falam falsamente. (98) A missão à qual devotara toda a vida, que Lhe custara a vida de um amado filho mais moço (99) como também a perda de todas as posses materiais, que Lhe abalara profundamente a saúde e Lhe trouxera aprisionamento, exílio, injúrias e maus tratos, não era de Sua iniciativa. "Não por Minha própria Vontade", assegurou, havia Ele Se lançado em tal caminho: Pensais, ó povo, que Eu detenha nas mãos o controle da Vontade e Desígnio supremos de Deus? Tivesse estado em Minhas mãos o destino final da Fé de Deus, jamais teria Eu consentido, nem por um momento sequer, em Me manifestar a vós, nem teria permitido que palavra alguma fluísse de Meus lábios. Disso é testemunha, verdadeiramente, o próprio Deus. (100) Tendo aquiescido sem reservas ao chamado de Deus, Ele não tinha dúvida alguma quanto ao papel que fora convocado a desempenhar na história humana. Como a Manifestação de Deus para a era do cumprimento, Ele é o prometido de todas as escrituras do passado, o "Desejo das Nações", o "Rei da Glória". Para o Judaísmo, é o "Senhor dos Exércitos", para o Cristianismo, a Volta de Cristo na glória do Pai; para o Islã, o "Grande Anúncio"; para o Budismo, o Buda Maitreya; para o Hiduísmo, a nova encarnação de Krishna; para o Zoroastrismo, o advento do "Sháh-Bahrám". (101) Assim como as Manifestações de Deus que O precederam, Ele é tanto a Voz de Deus como o seu canal humano: "Quando contemplo, ó meu Deus, a relação que me liga a Ti, sou impelido a proclamar a todas as coisas criadas: ‘Verdadeiramente, sou Deus!’; e quando considero meu próprio ser, - vê, parece-me mais tosco que a argila!" (102) "Alguns dentre vós" - declarou Ele - "têm dito: ‘Ele é Quem teve a pretensão de ser Deus.’ Por Deus! Isso é calúnia flagrante. Sou apenas um servo de Deus que acreditou Nele e em Seus sinais... Minha língua e Meu coração e Meu ser exterior, tanto quanto o interior, atestam que não há outro Deus senão Ele, e todos os outros foram criados a Seu mando e moldados pela operação de Sua vontade... Sou Aquele que difunde em toda parte as graças com as quais Deus, por Sua bondade, Me favoreceu. Se é essa Minha transgressão, então sou, em verdade, o primeiro dos transgressores..." (103) Os escritos de Bahá’u’lláh recorrem a inúmeras metáforas, na tentativa de exprimir o paradoxo presente no âmago do fenômeno da Revelação da Vontade de Deus: Sou o Falcão real no braço do Onipotente. Desdobro as asas caídas de todo pássaro prostrado e impulsiono-lhe o vôo. (104) Este Ser é apenas uma folha movida pelos ventos da vontade de teu Senhor, o Todo Poderoso, Alvo de todo louvor. Poderá aquietar-se em soprando os ventos tempestuosos? Não, por Aquele que é o Senhor de todos os Nomes e Atributos! Movem-na a seu bel-prazer... (105)
O Convênio de Deus com a Humanidade
Em junho de 1877, Bahá’u’lláh finalmente saiu do confinamento estrito da cidade prisão de ‘Akká e mudou-Se com a família para "Mazra’ih", uma pequena propriedade rural algumas milhas ao norte da cidade. (106) Como fora predito em Sua epístola ao governo turco, o Sultão ‘Abdu’l-Aziz fora deposto e assassinado em um golpe palaciano, e os ventos das mudanças políticas que varriam o mundo começavam a invadir até mesmo os herméticos recintos do sistema imperial otomano. Após uma breve estada de dois anos em Mazraíh, Bahá’u’lláh fixou residência em "Bahjí", uma ampla mansão rodeada de jardins que Seu filho ‘Abdu’l-Bahá havia alugado para Ele e a família. (107) Seus doze anos finais de vida foram dedicados a Seus escritos, concernentes a um largo espectro de temas espirituais e sociais, e ao acolhimento do fluxo de peregrinos bahá’ís que para lá convergiam, com grandes dificuldades, vindos da Pérsia e de outras terras. Tanto no Oriente Próximo como no Médio, o núcleo de uma vida comunitária começava a tomar corpo entre os que haviam aceito Sua mensagem. Para sua guia, Bahá’u’lláh revelara um sistema de leis e instituições concebidos para por em vigor, na prática, os princípios estabelecidos em Seus escritos. (108) A autoridade foi outorgada a conselhos eleitos democraticamente pela totalidade da comunidade, com dispositivos destinados a excluir a possibilidade do surgimento de uma elite clerical. Foram também instituídos princípios de consulta e tomada de decisão grupal. No cerne desse sistema estava o que Bahá’u’lláh denominou um novo Convênio entre Deus e a humanidade. O aspecto distintivo da maturação humana é que, pela primeira vez na história, todo o gênero humano está conscientemente envolvido, ainda que de forma turva, na percepção da própria unidade e da Terra como a pátria comum. Esse despertar abre caminho para um novo relacionamento entre Deus e a humanidade. À medida que os povos do mundo aceitarem a autoridade espiritual inerente à guia da Revelação de Deus para esta era, afirma Bahá’u’lláh , hão de encontrar em si mesmos um poder moral que os esforços humanos, por si só, têm-se mostrado incapazes de engendrar. "Uma nova raça de homens"(109) surgirá como resultado desse relacionamento, e o trabalho da construção de uma civilização global terá início. A missão da comunidade bahá’í é demonstrar a eficácia desse Convênio para curar os males que dividem a raça humana. Bahá’u’lláh faleceu em Bahjí em 29 de maio de 1892, em Seu 75o ano de vida. Na época de Seu passamento, a Causa que Lhe fora confiada quatro décadas antes da escuridão da Masmorra Negra de Teerã estava pronta para libertar-se das terras islâmicas onde se formara e estabelecer-se na América e na Europa, primeiramente, e depois por todo o planeta. Com isso, a própria Causa viria a ser uma comprovação da promessa do novo Convênio entre Deus e a humanidade; pois em contraste com as demais religiões independentes do mundo, a Fé Bahá’í e sua comunidade de adeptos vieram a concluir com êxito a travessia do crítico primeiro século de existência, com a unidade intacta e firme, incólume à praga antiqüíssima do cisma e da dissensão. Sua experiência oferece uma evidência poderosa em favor da asseveração de Bahá’u’lláh de que a raça humana, com toda a sua diversidade, é capaz de aprender a viver e trabalhar como um único povo, em uma pátria global comum. Apenas dois anos antes de Sua morte, Bahá’u’lláh recebeu em Bahjí um dos poucos ocidentais a visitá-Lo, e o único a deixar um relato escrito da experiência. O visitante era Edward Granville Browne, um jovem orientalista em ascensão da Universidade de Cambrigde, cuja atenção fora originalmente atraída pela história dramática do Báb e de Seu heróico grupo de seguidores. De seu encontro com Bahá’u’lláh, Browne escreveu: Embora suspeitasse vagamente para onde ia e com quem haveria de estar (pois nenhuma informação precisa me fora dada), um segundo ou dois passaram-se antes que eu, com um frêmito de admiração e reverência, percebesse claramente que a sala não estava deserta. No canto onde o divã encontrava a parede estava sentava uma maravilhosa e venerável figura... A fisionomia daquele a quem fitava, jamais a poderei esquecer, embora não possa descrevê-la. Aqueles olhos penetrantes pareciam ler-nos a própria alma; poder e autoridade residiam naquela testa larga... Escusado era perguntar na presença de quem estava, enquanto me curvava diante daquele que é objeto de uma devoção e um amor que os reis poderiam invejar e os imperadores almejar em vão! Uma voz suave e cheia de dignidade convidou-me a sentar, e então prosseguiu: "Louvado seja Deus por haveres alcançado!... Vieste ver um prisioneiro e exilado... Só desejamos o bem do mundo e a felicidade das nações; não obstante, consideram-nos instigador de discórdia e sedição, merecedor de cativeiro e banimento... Que todas as nações se tornem uma na fé e todos os homens venham a ser como irmãos; que os laços de afeição e unidade entre os filhos dos homens sejam fortalecidos; que cesse a diversidade de religião, e as diferenças de raça sejam anuladas - que mal há nisso? ...E assim há de ser: essas lutas infrutíferas, essas guerras ruinosas hão de passar, e a ‘Paz Máxima’ há de chegar..." (110)


http://www.bahai.org.br/virtual/Artbaha.htm